23 novembro 2006

Era um quadro

Era um quadro, onde ela estava à lareira quente de um Janeiro antigo, com brasas murmurando uma velha melodia, envolvente e distante. À distância de uma parede vertical. Intransponível para tudo que não o olhar...

Egoísta perpendicular esta, do olhar e do quadro. Que se deixa criar e sentir, apenas para maior ensejar. Sem permissão de tocar. Sem possibilidade real. Sem amar.

O peso do quadro cedeu nas minhas mãos e tombou sobre o cavalete, o óleo escandalizado, os pinceis mutuamente se excomungando. Obliquas decidem-se, não se choram. Decidem-se com mãos sujas de tinta e roupa estragada. Com noites mal dormidas e madrugadas trabalhadas. E ali, onde eu me faltava, entre ela e o carvão ardente, me instalei de novas e vivas cores. E até na tela fomos felizes.